Escuta o meu silêncio…
Assim como na música o silêncio entre as notas marca o ritmo e na arquitectura os espaços vazios dão forma às estruturas, também a verdade interior de cada um, muitas vezes se revela silêncio.
Na nossa subjectividade, onde há silêncios habitam pessoas, memórias, coisas, factos, traumas, emoções, ressentimentos, culpas… e sentimentos por vezes de tal forma dolorosos que se pensa ser melhor guardá-los para sempre em baús secretos, fechados a sete chaves … em silêncio… as emoções podem no entanto revelar-se de formas muito subtis, quase imperceptíveis, por vezes até disfarçadas e invisíveis para os menos atentos…
É assim que na Psicoterapia, o doloroso espreita muitas vezes pelas portas entreabertas do silêncio, destapando desta forma o véu que oculta a verdadeira natureza do sofrimento individual… cabe ao Psicoterapeuta descodificar os silêncios do paciente, sem qualquer interrupção ruidosa da sua natureza reveladora; Só assim se conseguem escutar sentimentos através de silêncios, e as necessidades e desejos que tentam manifestar-se através da ausência de palavras. Por vezes, basta ficar em silêncio (o silêncio pode ser encorajador)… tentando apenas escutar o silêncio do Outro… isto pode ter um tremendo poder transformador.
Na Psicoterapia o Silêncio é a forma mais pura de revelação emocional. Este é sempre propriedade privada, acontece por determinadas razões e em determinados momentos, não por acaso ou falta de palavras para se expressar, mas porque foi naquele momento específico que alguém decidiu remeter-se à ausência de expressão… e desta forma escancarar as portas do seu sofrimento… porque a dor emocional tem o poder de silenciar a voz da razão.
O não dito tem assim um valor superior ao de muitas palavras que nem sempre conseguem definir ou exprimir quão distinta e avassaladora pode ser a experiência humana do sofrimento. Em silêncio, o indizível não pode ser resignificado, contextualizado, suavizado… e por isso mantém-se sempre assustador, paralisante, indizível… silencioso!
Mas é verdade que há quem não tolere o silêncio (talvez pela sua natureza reveladora) e tente desesperadamente preenchê-lo… o Silêncio pode ser tão assustador como o vazio, gerando o mesmo tipo de angústias e medos,
“O vazio é o espaço da liberdade, a ausência de certezas.
Mas é isso o que tememos: o não ter certezas.”
Dostoiévski
O Psicoterapeuta é por isso também um intérprete, um tradutor de silêncios, um companheiro de viagem (não um guia) colaborando na tarefa de pensar, dar um nome e um significado ao que nem sempre pôde ser pensado, recordado ou sentido (vivido na plenitude), para que desta forma o paciente se permita sofrer o sofrimento de forma segura e libertar-se das amarras sufocantes do silêncio e do medo que o impediam de expandir e sua criatividade e capacidade de pensar e viver. Quando se interrompe o silêncio sobre os aspectos emocionais dolorosos, todo o potencial de realização e felicidade pode enfim libertar-se.
Rolando Andrade
Psicólogo Clínico
Psicoterapeuta
Psicólogo do Desporto
Cédula profissional O.P.P 4365
António Oliveira
28 January, 2021 at 13:01Gostei muito do artigo. Talvez porque o silêncio sempre foi o meu melhor amigo. Boa quinta-feira, Dr. Rolando